quarta-feira, 10 de abril de 2013

Raul Kawamura e a Boa Vista: histórias e fotografias

por Robson Gomes

Raul Kawamura: filho de japonês, nascido em João Pessoa, morador da Boa Vista /
Foto: Raul Kawamura/Facebook

Se tem uma coisa que temos aprendido bastante no nosso processo de formação jornalística é como ter feeling para encontrar uma boa história pra contar, com um personagem representativo. E para isso é preciso correr atrás, pesquisar, sondar, apurar... Uma tarefa árdua, difícil e, porque não, desgastante. Principalmente quando o famoso deadline ameaça vorazmente a sua produção. Na correria do dia, e na dificuldade de estabelecer um contato, apelamos para as redes sociais, que têm se mostrado um grande aliado na busca dessas pessoas que podem nos auxiliar na redação de uma boa pauta.
            
Para chegar ao meu entrevistado, um site de busca foi o meu primeiro aliado. Procurando com  expressões chave como “curiosidades boa vista recife”, “curiosidades culturais boa vista recife” e variantes, encontrei uma notinha de uma exposição fotográfica sobre os principais pontos do centro do Recife já encerrada há quatro meses, mas um elemento em especial chamou a minha atenção: “Morador da Boa Vista...” Bingo! Encontrei um cara que fez uma exposição de fotos com o bairro da Boa Vista e ele ainda mora por lá? Eis a minha eureka! Mas ao ficar feliz em encontrar o elemento interessante para ser minha pauta, na hora a preocupação surgiu: como encontrá-lo?
    
O problema teria solução cerca de um minuto depois quando, ao digitar o nome dele no Facebook, o encontrei sem nenhuma grande dificuldade. Na hora, mandei uma mensagem inbox, na qual só tive respostas mais de 24 horas depois, mas positiva. Estava definido: iria entrevistar o designer gráfico, fotógrafo, produtor cultural e professor de karatê, Raul Kawamura.

O "escritório" de Raul / Foto: Raul Kawamura/Facebook
O lugar marcado para a sua entrevista foi o seu escritório. E daí a primeira surpresa. É impressionante como certas palavras nos passam certas impressões. Quando se fala em escritório, imagina-se um lugar morto, com bancadas e cadeiras, cercado de papeis e gente estressada. Definitivamente, não foi esse cenário que eu encontrei no escritório de Raul. Localizado na agitada Rua Dantas Barreto, mergulhei na tranquilidade de um enorme ateliê localizado no nono andar do Edifício Pernambuco. Em vez de birôs velhos, encontro mesas modernas. Em vez de cadeiras, encontro redes. Em vez de muitos papeis, me deparo com telas de pintura. Além disso, o lugar era arborizado pelas janelas que quase circundam todo o espaço. E em vez de gente estressada encontro os amigos de Raul (desde a faculdade de Design) que dividem o “escritório” com ele.
    
Comecei a entrevista fazendo uma pergunta óbvia, mas necessária já que estava o conhecendo naquele momento. Perguntei sobre seus traços orientais e se ele havia nascido no Recife, a resposta não podia ser mais surpreendente: “Não. Eu nasci em João Pessoa e meu pai é japonês. Ele tem uma escola de artes marciais na Rua do Sossego há quase 30 anos. O sobrenome Kawamura vem por parte de pai”, justificou.
   
Formado em Design Gráfico pela UFPE no ano de 93, perguntei como ele conciliava os ofícios de designer, fotógrafo, produtor cultural e professor de karatê: “São profissões bem diferentes. O karatê é para aliviar o estresse do trabalho, e é uma forma de voltar para mim mesmo. Gosto muito de praticar e ensinar, porque é ensinando que a gente aprende. Fazer atividades diferentes é muito saudável, até para gente se desprender um pouco dos outros trabalhos, além de aumentar o ciclo de amizades. Tenho tempo pra tudo”, garantiu ele, que fica boa parte do dia no ateliê e duas vezes por semana leciona karatê na academia do pai.
   
Sobre a exposição “Recife em Retratos” – a razão que me levou a conhecê-lo – ele contou que sempre quis executar esse projeto: “mas eu morava muito longe, em Jardim Atlântico”, comentou. Mas mesmo assim, Raul mantinha contato com o bairro da Boa Vista comprando livros sobre este bairro e sobre fotografia nos sebos (lojas informais de livros usados). No ano de 2004, quando chegou para morar no bairro da Boa Vista, o projeto foi finalmente posto em prática: “Sempre tive interesse no bairro da Boa Vista porque é um bairro antigo, onde Recife cresceu. No caminho da academia do meu pai, na infância e adolescência, circulei por boa parte deste bairro. Desde então, eu sempre quis rever esses caminhos e explorar os desconhecidos”, colocou.
    
Durante três anos, com apenas uma câmera digital, Raul ficava atento às construções antigas, aos casarões, galpões abandonados, construções de luxo que hoje se tornaram cortiços, sempre em busca desses resquícios de antigamente na Boa Vista e nos bairros vizinhos. Além desses elementos concretos, uma textura, uma forma geométrica, uma combinação também o inspirava a fazer uma foto. 
   
Como as redes sociais ainda não eram a febre de hoje em dia, ele postava as suas fotos num blog, sempre bem frequentado e comentado. “Foi quando um amigo meu que trabalha no CCBA [Centro Cultural Brasil-Alemanha] sugeriu que eu expusesse as fotos”, completou. A iniciativa do amigo originou a exposição que ficou em cartaz entre os meses de outubro e dezembro de 2012 neste mesmo Centro Cultural: “Deu muito trabalho, mas o pessoal do CCBA deu todo o suporte”, garantiu Raul. Indagado se a exposição foi um sucesso, ele comemorou: “Eu fiz toda a divulgação pelo Facebook e fiquei impressionado porque veio muita gente. Foi um saldo muito positivo. Uma pessoa de assessoria divulgou a exposição na imprensa. Mas o ‘Face’ foi fundamental nessa divulgação”.
    
E se ele pudesse resumir toda a exposição “Retratos do Recife” em apenas uma foto? A resposta de Raul foi categórica: “Tem uma foto da Guararapes que tem um cartaz azul grudado na parede de um fiteiro. Nesse cartaz tem escrito: ‘Vá em Frente, apaixone-se’. Gosto da imagem por causa das cores, da mensagem e do local”, concluiu.

A foto escolhida por Kawamura para resumir a exposição "Retratos do Recife" / Foto: Raul Kawamura/Diario de Pernambuco

Atualmente, Kawamura já está envolvido num novo projeto de fotografia, chamado “Recife Noturno”. Todas as noites, ele sai de bicicleta tirando fotos de ruas estranhas nos arredores da Boa Vista, em lugares que não tem gente. Neste início de trabalho, as fotos estão sendo tiradas com o celular, mas posteriormente pretende-se fazer com câmeras grandes, tripés, de forma mais profissional. Quem quiser conferir este trabalho, basta acompanhar o seu Facebook pessoal – sua principal vitrine atualmente – ou seguir @raulkw no Instagram, pois já tem fotos no ar.
       
A tarde começava a se despedir no Recife quando perguntei a Raul o que a Boa Vista representa para a sua vida cultural: “Primeiro porque é o lugar onde o meu pai possui a academia há quase 30 anos atrás. E depois, a Boa Vista é um dos bairros onde o Recife começou, junto com Santo Antônio, São José, Recife Antigo... Aqui tem elementos arquitetônicos e urbanísticos originais da cidade de antigamente. Além de ter essa memória afetiva de andar muito por aqui quando era criança”, enfatizou.
            
O espírito jovial e tranquilo que move esse designer de 48 anos, morador da Rua do Progresso, é admirável, mas não é surpresa para o próprio Raul: “No Japão é muito comum os guerreiros que praticam artes marciais desenvolver um tipo de arte para equilibrar as energias”, declarou. E foi na loucura do centro da cidade que o meu lado guerreiro de ir em busca de uma matéria se harmonizou ao me deparar com a simplicidade da arte, através desse olhar apurado e sensível sobre a Boa Vista de Raul Kawamura. 

LINKS:
Veja algumas fotos da exposição "Recife em Retratos" publicado no Diario de Pernambuco: http://bit.ly/154caMC
Facebook Oficial Raul Kawamura: https://www.facebook.com/raulkw
Instagram: @raulkw
Vídeo com todas as fotos da exposição "Recife em Retratos": http://bit.ly/12J1F0D

1 comentários:

Gente, foto só se for produção própria!

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