segunda-feira, 25 de março de 2013

Cinema São Luiz: Ontem e Hoje

por Houldine Nascimento e Mário Rolim 

São Luiz logo antes de uma sessão de Django Livre / Foto: Caroline Melo

Desde a sua fundação, em 6 de setembro de 1952, o Cinema São Luiz já passou por várias transformações até se tornar o espaço que é hoje, de beleza e qualidade amplamente reconhecidas. Entre 2006 e 2009, o local foi fechado para reforma. Em 2008, havia projeto das Faculdades Integradas Barros Melo (AESO) para transformar o lugar num centro cultural, mas não foi adiante. Sendo assim, o Governo de Pernambuco assumiu a reforma, que terminou em 2009. Em 2011, a sala, que era do Grupo Severiano Ribeiro desde a sua criação, foi comprada pelo Governo do Estado por 2,5 milhões de reais.

Geraldo Pinho assumiu a programação da sala em abril de 2011. “Cinemeiro” assumido – é assim que ele se intitula, em vez de “cinéfilo”, termo mais comum –, não tem vergonha em admitir sua paixão pelo cinema. “Passei mais tempo dentro do cinema do que numa mesa de bar. Quando não estudava, estava aqui”.

Geraldo Pinho no hall do 1º andar do São Luiz / Foto: Caroline Melo


Ele foi pela primeira vez ao São Luiz em 1961, para ver um melodrama mexicano chamado La Violetera (Luis César Amadori, 1958), dois dias após chegar ao Recife. “Tinha 11 anos e nunca tinha visto nada igual. Eu sou de Santos e frequentava um cinema a 50 metros da minha casa, com as cadeiras de madeira. Já me impressionei com a entrada. Vim de paletó. Quando terminou o filme e as luzes se acenderam, tive um choque. Fiquei encantado”, revelou. 

Outro que frequenta o São Luiz há um bom tempo é o cineasta Marcelo Pedroso (diretor do premiado documentário Pacific, de 2009). “O primeiro filme que vi lá foi E.T. – O Extraterrestre (Steven Spielberg, 1982). Eu era pequeno, tinha só seis anos, e não tenho muita lembrança disso, só do que meus pais contam. Na adolescência, ia muito. ‘Gazeava’ aula no colégio para assistir aos filmes, e era muita balbúrdia, uma confusão danada”, comentou.

Sobre seu trabalho na programação da sala, Pinho declarou: “É tudo oportunidade, mercado, os filmes que estão em cartaz. O programador não tem uma fórmula. Como programador, tenho cuidado para fazer a programação para toda a cidade, não só para um grupo de iniciados. É preciso traçar uma linha e manter qualidade. Devagar você vai apertando, formando as pessoas. Você tem que iniciá-las no cinema não com obras mais desafiadoras. Abrir mais cinemas, trazê-las para o cinema. Então, quando elas já estão mais acostumadas e menos esperam, ‘taca’ um Glauber Rocha!”

Mas ele é o primeiro a reconhecer que sofre muitas dificuldades, principalmente quanto à distribuição limitada dos filmes. “Por que um filme pernambucano não pode passar no São Luiz assim que ele entra em cartaz? Eu fico puto (sic) com isso. A população vê o filme aqui quando ele já está frio, depois de dois, três meses. Eu venho cutucando a onça com vara curta desde o ano passado. Por que os filmes pernambucanos são muito mal lançados no Recife? Filmes como Febre do Rato (Cláudio Assis, 2011) deviam ser exibidos, pelo menos, nos cinemas públicos. Se eu pudesse passar os filmes no mesmo período em que eles estão em cartaz nos outros cinemas, seria ótimo. Aqui não é como em São Paulo, onde se tem uma diversidade de lugares exibindo o mesmo filme. Aqui são disputadas as mesmas pessoas, por isso não cresce”, pontuou.

Ele também ressaltou o papel do governo no processo, dizendo: “uma das funções do Estado é pegar a obra e exibir para as pessoas, não só fomentar. Nós temos mais de cinco mil municípios e só 300 têm cinema. Enquanto isso, gastam milhões fazendo filmes que quase ninguém vê. Só vão para festival, para meia dúzia de deslumbrados assistirem. O Brasil é o país dos festivais, são centenas e todos com dinheiro público”.

Além de todos esses problemas, há a resistência da própria população. Um episódio emblemático para exemplificar isso é o que envolveu Geraldo Pinho e um colégio tradicional – cujo nome não foi mencionado – de Casa Forte, que tentou organizar uma visita ao Cine São Luiz recentemente. “Os alunos estavam fazendo um trabalho sobre Lula Cardoso Ayres e havia duas tarefas extra-classe: uma era visitar o Instituto dele, em Piedade, e a outra era vir ao São Luiz para ver um painel dele que fica aqui no saguão de entrada. Eles sairiam da escola num ônibus bastante confortável e viriam acompanhados de Lula Cardoso Filho. Tudo estava acertado, mas, depois de 15 dias, o responsável do colégio me liga constrangido, dizendo que não seria mais possível a vinda. Alguns pais não queriam que os filhos viessem por questão de segurança”.

Para explicar esse medo, Geraldo Pinho aponta a própria desvalorização do centro da cidade como fator principal. Além da precariedade da segurança no entorno do cinema e da dificuldade em encontrar estacionamento, a sala tem enfrentado concorrência pesada dos multiplexes, cada vez mais luxuosos. Tanto é que, neste momento, o Recife só conta com outras dois salas de rua: o Cinema do Parque – fechado para reforma há mais de dois anos e sem previsão de abertura – e o Cinema Apolo, em baixas condições técnicas de funcionamento.

Nesta tentativa de revitalizar o São Luiz, Marcelo Pedroso destaca os vários festivais que são sediados nele ao longo do ano, principalmente a Janela Internacional de Cinema do Recife, que ocorre em novembro e consegue até lotar a sala numa sexta ou sábado à noite. “O São Luiz agora voltou com muito fôlego, com uma programação diferenciada e que está atingindo o papel de formação de público. É a sede do ‘Janela’ desde que reabriu, e o festival tem feito um trabalho muito bom de revalorizar o espaço, de atrair novamente o público, fazendo as pessoas retomarem esse gosto de ir para o centro. Então eu penso que [o São Luiz] é um grande símbolo de resistência na configuração da cidade, na forma como a cidade se organiza. Um espaço lindo daquele tamanho, no centro da cidade, cravado ali na beira do rio, tem um significado político, traz uma força”.

Pinho também falou sobre a importância do São Luiz para a cidade. “É um equipamento raríssimo, singular no mundo inteiro. E que tem história, isso é a importância maior, não só para o bairro da Boa Vista, mas para a cidade e para o Brasil. Funciona até hoje atendendo aos objetivos para os quais foi construído, que é de preservar gerações. Trata-se de uma joia que tem que ser mantida em funcionamento e passada para as novas gerações”.


Centro do Recife visto do 1º andar do São Luiz / Foto: Caroline Melo

PÚBLICO - Visitamos o São Luiz numa terça, antes de uma exibição de Django Livre (Quentin Tarantino, 2012), às 15h. Os espectadores chegavam aos poucos, muitos porque não conseguiram ver o filme nos shoppings, onde o longa já saiu de cartaz, um ou outro pelo prazer de revê-lo no São Luiz. O estudante Rivaldo de Castro, por exemplo, ressaltou que gosta da estrutura do cinema, mas prefere os multiplexes por serem mais confortáveis.

Doutorando em Educação da UFPE, Fábio Paiva disse que gosta muito do ambiente do cinema, mas costumava frequentá-lo mais quando morava ali perto, na Rua da Aurora. Sobre as diferenças na projeção, ele destacou a enorme tela do São Luiz e o som, que, segundo ele, não é ensurdecedor como em outras salas. Ao ser questionado, ele não soube dizer a diferença de assistir ao filme no São Luiz, apesar de reconhecer que seria uma experiência diferente, mas revelou que lhe agrada a exibição de filmes não tão dentro do circuito. Ao início da sessão, a sala não parecia ter mais de 30 pessoas, assim como quando vimos Argo (Ben Affleck, 2012), algumas semanas antes.

O público pode parecer escasso, mas isso não abala a confiança de Geraldo Pinho. “Em 2012 o público dobrou em comparação com o ano anterior. Este ano, o mês de janeiro já superou os meses de janeiro e fevereiro do ano passado. Para você mudar tudo isso, leva tempo, tem que formar uma equipe para conseguir”, disse.

Em breve o São Luiz exibirá filmes em 3D. Isto porque, em dezembro de 2012, uma empresa foi contratada por meio de licitação para instalar novos equipamentos. Com isso, o local ganhará novo sistema de som e um projetor 4K digital – com suporte para filmes em 3D –, desta vez permanentemente. Nas últimas edições da Janela, era preciso importar um este tipo de projetor, o que demanda grandes custos. Os novos equipamentos devem chegar em junho deste ano.

Pinho não se preocupa nem com o download de filmes pela internet nem com a venda dos mesmos nas ruas, muitas vezes praticamente na porta do cinema. Ele não chega a ser contra a prática, mas destacou: “cinema é essa coisa coletiva. Tem hora que todo mundo ri junto, chora junto. Vir ao cinema é uma experiência completamente diferente, não tem jeito”, concluiu.

1 comentários:

1. "ao invés de 'cinéfilo'" - sempre preferir o termo "em vez de". Ao invés significa "ao contrário" e tem sentido de algo oposto, o que não é o caso de cinéfilo e cinemeiro.

2. "50m" - dar espaço entre o valor e a unidade de medida: 50 m.

3. Padronizar a escrita dos números. Em alguns momentos, os números até dez estão escritos por extenso e como numeral em outros.

5. "na porta do Cinema" - não precisa do C em caixa-alta.

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