terça-feira, 2 de abril de 2013

O mistério na Estrada dos Remédios, 2231

por Suzana Mateus

Edifício Nossa Senhora Aparecida/Foto: Suzana Mateus

Entre conversas, rumores e especulações, um passado tortuoso sobre Fátima, moradora de rua da Boa Vista, foi sendo construído. Pouco se sabe sobre a já consolidada moradora da Avenida Manoel Borba que adotou a fachada de nº 709 como seu lar. Mas dentre tantas versões, eis que surgiu um fato importante: Fátima já foi personagem de uma matéria do Diario de Pernambuco.

A matéria foi publicada em 15 de novembro de 2011. Nela, podemos ver fotografias de uma Fátima aparentemente mais saudável. Podemos ver também que as três entradas da casa 709 estão fechadas, o que nos leva a acreditar que a matéria foi realizada após a volta da moradora do hospital. Uma barraca de camping montada na frente da casa amarela servia como residência para ela diante do impasse causado pelas barreiras de cimento e tijolos colocadas nos três batentes onde a sem teto se hospedava.

A reportagem feita pelo jornalista Wagner Oliveira atraiu as atenções de duas pessoas que reconheceram D. Fátima: Gilba Mafra, antiga vizinha, e o engenheiro Joel César de Albuquerque Júnior, ex-colega de trabalho da ex-secretária do Grupo Votorantim. Ao entrar em contato com D. Gilba, nos deparamos com uma surpresa: a aposentada disse ter se enganado. A história contada por ela e publicada pelo jornal, na verdade, pertence a outra Fátima. “Eu me enganei, mas pelo jornal elas pareciam ser a mesma pessoa. As duas são bastante vaidosas”, conta.

Matérias sobre Fátima foram publicadas pelo Diario nos dias 15 e 24 de dezembro de 2011/Foto:  Reprodução

Em 2011, ao ver a matéria do dia 15, a aposentada começou a suspeitar que aquela mulher das imagens seria a Fátima que ela conhecia. D. Gilba se baseou nas lembranças do último encontro entre elas, pois nele, a antiga vizinha “já estava muito diferente”. Com várias sacolas nas mãos, como se levasse tudo o que tinha para todo o lugar, aquela que já havia sido secretária do Grupo Votorantim agora estava vendendo colares velhos. Gilba não se interessou por eles. Deu uma ajuda em dinheiro a Fátima e esta logo partiu. Nessa época, a antiga moradora do apartamento 1 do Edifício Nossa Senhora Aparecida (Estrada dos Remédios, Madalena) disse estar morando com uma amiga. Coincidentemente, como contou Edilson, quando D. Fátima da Boa Vista começou a morar na Avenida Manoel Borba ela também vivia com uma amiga.

Outro vizinho também se pronunciou sobre o fato. Foi Adilson Fernandes de Carvalho. Ele disse ter visto “a Fátima verdadeira” numa igreja Universal há alguns meses. “Essa Fátima do jornal não é a mesma que morou aqui na Madalena. Quando a vimos pessoalmente, descobrimos que são pessoas completamente diferentes”, conta Adilson. Segundo ele, hoje a Fátima da Madalena é casada e conseguiu se estruturar na vida. Ficou muito chateada com a repercussão da matéria e pensa em recorrer à justiça para atenuar a situação.

A Fátima que era da Madalena e hoje mora em Campo Grande confirma a versão de Adilson. Através de uma ligação, ela se mostrou revoltada com a história. Se considera vítima de calúnia e difamação e quer procurar o jornal para tomar providências. Ao ser questionada se chegou mesmo a morar nas ruas durante o período de dificuldades que passou, quando vendia os tais colares velhos, Fátima diz apenas que “se ela morou na rua ou não, ninguém tem nada a ver com isso”. “Todos nós passamos por dificuldades, o meu Deus é maior”, destaca. Ela prefere se pronunciar sobre o assunto apenas com seu advogado.

D. Fátima da Boa Vista continua, assim, a ser um sujeito sem história. Um personagem que não tem um começo conhecido. Que faz parte da vida de tantos, que desperta a atenção de quem passa, mas não tem um passado que queira compartilhar. Continuará levantando indagações e despertando a atenção dos vizinhos que não sabem, afinal de contas, qual a é história que existe por trás daquele olhar. A Fátima que pode ser mãe, viúva, santa ou letra de música talvez continuará a passar seus dias contemplando o silêncio que escolheu para si. Munida de sua vaidade, a moradora segue como um mito desconhecido, suspeito e indagador. Não se sabe até quando.

Fátima durante a realização da matéria para o Diario/Foto: Blenda Souto Maior/DP/D.A PRESS

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